quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

DOMINGO DA SAGRADA FAMÍLIA 2014


Com a luz do Natal nos é manifestada a cada um de nós a infinita bondade de Deus. Em Jesus Cristo o Pai celestial inaugurou uma nova relação conosco; nos fez “filhos em seu Filho”. Não somos só criaturas; somos filhos. Deste modo nos atrai a si no momento de sua encarnação, ao fazer-se um de nós.
 Por conseguinte, pertencemos  verdadeiramente  à família que tem Deus  como Pai, porque Jesus, o Filho unigênito, veio colocar sua morada em meio a nós, a morada de sua carne, para congregar  todas as pessoas em uma única família, a família de Deus, que pertence realmente ao Ser divino: todos estamos unidos em um só povo, em uma só família.
Veio para nos revelar a verdadeira face do Pai. E se agora nós usamos a palavra Deus, já não se trata de uma realidade conhecida somente de longe. Nós conhecemos a face de Deus: é a face do Filho, que veio para fazer mais próxima a nós a terra, as realidades celestes. São João  explica: “Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado  a Deus, mas no fato de Ele nos ter amado primeiro” – 1Jo 4, 10.
No Natal ressoa no mundo inteiro o anúncio simples e desconcertante: “Deus nos ama”. “Nós amamos, diz S. João, porque Ele nos amou primeiro” 1Jo 4,19. Este mistério já está colocado em nossas mãos  porque, ao experimentar o amor divino, vivemos orientados às realidades  do céu. E o exercício destes dias consiste também em viver realmente orientados a Deus , buscando antes de tudo o Reino e a sua justiça, com a certeza de que o resto, todo o resto, nos será dado como acréscimo – cf Mt 6, 33. O clima espiritual do tempo natalino nos ajuda a crescer nesta consciência.
Contudo, a alegria do Natal nos faz esquecer o mistério do mal- mysterium iniquitatis-, o poder das trevas, que tenta obscurecer o esplendor da luz divina; e, infelizmente, experimentamos cada dia este poder das trevas. No prólogo do seu Evangelho, que proclamamos várias vezes nestes dias, o evangelista João escreve: “A luz brilha nas trevas, e as trevas não a acolheram” – Jo 1, 5.
É o drama da rejeição a Cristo que, como no passado, também  hoje se manifesta e se expressa, infelizmente, de muitas formas diversas. 
Talvez na época contemporânea estejam também mais disfarçadas e perigosas as formas de rejeição de Deus: vão desde a rejeição em si até a indiferença, desde o ateísmo cientificista até a apresentação de um Jesus que dizem moderno e pós-moderno. Um Jesus homem, reduzido de modo diverso a um simples homem de seu tempo, privado  de sua divindade; ou um Jesus tão idealizado que parece às vezes personagem de uma fábula.
Mas Jesus, o verdadeiro Jesus da história ,é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, e não se cansa de propor seu Evangelho a todos, sabendo que é “sinal de contradições” – cf Lc 2, 34-35, como profetizou o velho Simeão.
 Na verdade, só o Menino que jaz no presépio possui o verdadeiro segredo da vida. Por isso pede que o acolhamos, que demos espaço em nós, em nossos corações, em nossas casas, em nossas cidades e em nossas sociedades.
Na mente e no coração ressoam as palavras do prólogo de São João: “A todos os que o acolheram lhes deu poder de tornar-se filhos de Deus” – Jo 1, 12.  Tratemos de nos contar entre os que o acolhem. Diante dele  ninguém pode ficar indiferente. Também nós, queridos amigos, devemos tomar posição continuamente.
Qual será, portanto, nossa resposta? Com que atitude o acolhemos? Vem em nossa ajuda a simplicidade dos pastores e a busca dos magos que, através da estrela, perscrutam os sinais de Deus; servem-nos de exemplo a docilidade de Maria e a sábia prudência de José.
 Os mais de dois mil anos de história cristã  estão cheios  de exemplos de homens e mulheres, de jovens e crianças e idosos que acreditaram no mistério do Natal  e abriram seus braços ao Emanuel, convertendo-se com sua vida em sinais de luz e esperança.
Que Maria nos ajude a abrir nosso coração ao Emanuel, que assumiu nossa pobre e frágil carne para compartilhar conosco o fatigoso caminho da vida terrena. Contudo, na companhia de Jesus este fatigante caminho se transforma em um caminho de alegria. Percorremos juntamente com Jesus, caminhemos com Ele; assim o ano novo será um ano feliz e bom.”

Cf.: Mistagogias de Bento XVI sobre a Igreja, tradução frei Boaventura Kloppenburg OFM, Ed. Vozes, 2007, pp 182-185.